sexta-feira, 28 de outubro de 2011


TEOLOGIA DOS MINISTÉRIOS

Pe. Cristiano Marmelo Pinto

Por que uma teologia dos ministérios?

Até a algum tempo atrás, falar de ministérios era abordar praticamente o sacramento da ordem em seus graus (episcopado, presbiterado, diaconado). Graças a renovação da Igreja ocorrida principalmente no Concílio Vaticano II, passou-se a abordar a diversidade dos ministérios eclesiais e não somente os ministérios ordenados. Isto porque na Igreja não existe apenas os ministérios ordenados, mas uma diversidade de ministérios leigos de igual modo importantes para a evangelização. Dentre tantos encontramos os ministérios de leitores, acólitos, catequistas, os ministérios extraordinários, etc.

O resgate do protagonismo dos leigos na Igreja certamente foi fundamental para que fosse revisto o conceito de ministérios que perdurou por longos séculos na Igreja, resgatando a teologia do sacerdócio batismal (comum) e redimensionando o sacerdócio ministerial (bispos e padres), bem como recuperando a riqueza do diaconado permanente e sua missão no contexto eclesial.

A teologia dos ministérios eclesiais se desenvolveu principalmente depois do Concílio Vaticano II com uma nova abordagem da eclesiologia, agora não mais centrada na estrutura hierárquica e piramidal da Igreja, mas sim, tendo a Igreja como Povo de Deus, onde todos, dentro da sua especificidade, colaboram com a missão da Igreja de levar a salvação a todos os homens e mulheres desta terra.

Os ministérios são um problema eclesiológico e não apenas uma questão funcional. É um problema de estrutura e manifestação da Igreja. Tem haver com a sua própria identidade. Neles estão implicados o ser e o aparecer da Igreja no cumprimento de sua missão no mundo. Deste modo, podemos dizer que a imagem que se tem da Igreja influirá na concepção dos ministérios e por outro lado, a configuração dos ministérios eclesiais depende do modelo de Igreja que se segue.

Por trás de uma concepção dos ministérios há sempre uma concepção de Igreja. Se se tiver uma concepção de Igreja mais “hierárquica-institucional”, que acentue o poder e a autoridade hierarquicamente diante da participação e da diversidade de carismas, vir-se-á a ter uma concepção de ministério mais centralizada, em que o clero é o que sabe, ordena e decide, ficando os ministérios leigos relegados à simples colaboração executiva .

Para uma verdadeira e fiel teologia dos ministérios é necessário seguir outra vertente, proposta pelo Concílio Vaticano II, numa linha de Igreja como “comunhão e participação”, onde os leigos assumem seu protagonismo na evangelização. Deste modo é possível falar de co-responsabilidade, de co-participação e consequentemente de diversidade de ministérios assumidos pelos leigos e leigas na ação eclesial.

Evidentemente que esta concepção de Igreja não desmerece a importância e a necessidade dos ministérios ordenados, mas forma uma complementaridade onde ministros ordenados e ministros leigos caminham juntos, se ajudam na construção do Reino de Deus.

Por este motivo, conceber uma teologia dos ministérios é assumir a diversidade dos ministérios no interior da Igreja e não mais utilizar o singular, mas o plural. Não mais apenas ter como verdadeiros ministérios os ordenados, mas também os não-ordenados, assumidos por leigos e leigas na obra da evangelização.

Os ministérios na missão da Igreja

Falar de ministérios é falar da própria missão da Igreja, pois, todos os ministros estão a serviço da missão que a Igreja recebeu de Jesus Cristo.

Jesus cumpriu a missão que recebeu do Pai, levando ao pleno cumprimento em sua paixão, morte e ressurreição. Porém, ele sabia que esta obra, que sua missão deveria chegar a todos os homens e mulheres deste mundo até a parusia. Por isso, ele constituiu os doze confiando a eles a continuidade de sua missão. Esta continuação da missão de Jesus Cristo é assegurada com o envio do Espírito Santo, fazendo com que a Igreja nascente se manifestasse ao mundo e levasse a todos a boa notícia do Reino.

A missão de Cristo é fundante e originante, enquanto que a missão da Igreja é continuadora da missão de Cristo. Podemos dizer que a missão da Igreja é:

a) Continuadora – porque prolonga na história o que o próprio Jesus Cristo realizou;

b) Referente – porque tem seu sentido e referência em Jesus;

c) Realizante – porque a Igreja deve atualizar e promover a salvação que Jesus Cristo nos trouxe;

d) Impulsionante – porque deve promover o Reino de Deus até o fim dos tempos.

A missão da Igreja tem as mesmas dimensões e características da missão de Jesus Cristo:

a) Dimensão profética ou da palavra (martyría);

b) Dimensão sacerdotal ou da liturgia (leitourgía);

c) Dimensão da caridade e da justiça (diakonia);

d) Dimensão da comunhão e da unidade (koinonía).

Da missão de Jesus Cristo nascem e fundamentam-se as diversas dimensões da missão que concentram em torno de si a diversidade de ministérios. Em torno da missão de Cristo a diversidade de ministérios encontra sua unidade. O Concílio Vaticano II afirma que: “existe na Igreja diversidade de ministérios, mas unidade de missão” . Esta unidade está no cumprimento da missão herdade de Jesus.

A missão de Jesus compromete a todos os membros da Igreja, todo o povo de Deus. Como afirmam os padres conciliares: “não existe assim membro que não tenha parte na missão de todo o Corpo” . Nela todos participam sejam os ministros ordenados e os não-ordenados (cf. AA 2).

Os ministérios afetam toda a Igreja como constitutivo de seu próprio ser e missão, ou seja, a Igreja não apenas possui ministérios, mas ela é toda ministerial, deve estar constantemente a serviço do Reino de Deus. Embora haja diferentes ministérios na Igreja, isso não significa que sejam exclusivos, pois os ministérios estão na Igreja para o cumprimento de sua ministerialidade.

Podemos concluir que por serem constitutivos da essência da Igreja, os ministérios não são exclusividades, mesmo os ordenador. Isto nos faz concluir igualmente que os ministérios na Igreja não são meras funções secundárias na sua missão, mas essenciais à Igreja. Eles não são acidentais a Igreja, mas fazem parte da sua estrutura.

Para realizar sua missão, a Igreja precisa dos ministérios e isto acontece do seguinte modo:

1) Relação acontecimento salvífico: continuidade histórica: em sua missão a Igreja dá continuidade à missão salvífica de Jesus Cristo. Ela é a mediação fundamental e cumpre esta missão através dos ministérios;
2) Relação missão – dimensões da missão: a diversidade de dimensões da missão de Jesus Cristo exige de igual modo a diversidade de ministérios;
3) Relação Espírito Santo – dons e carismas do Espírito: o Espírito Santo é a alma da missão da Igreja. Ele é princípio de unidade e ao mesmo tempo de diversidade. Todo ministério nasce de um carisma e supõe um carisma que nem sempre é idêntico;
4) Relação “alguns” – “todos”: desde cedo no Novo Testamento aparece “alguns” que receberam uma missão específica em relação a “todos”, mas não significa exclusividade, pelo contrário, pressupõe a diversidade ministerial;

Ao dizermos que os ministérios são um elemento constitutivo da Igreja, significa que também deve ser para a comunidade de forma concreta. Os ministérios devem ser entendidos não por cima da Igreja, mas no seu interior. A comunidade existe ministerialmente. Os ministérios não são um fim em si mesmos, mas um meio que deve concretizar-se a partir das necessidades da comunidade. Portanto, é preciso sempre partir das necessidades reais da comunidade para o surgimento dos ministérios em seu interior, e quem os suscita é o Espírito Santo.

Mas afinal, o que é ministério?

A palavra ministério vem do latim “ministerium” e significa o “ofício próprio do servo”, uma função de serviço. Devemos entender os ministérios a partir do sentido de servisalidade. Quem é o servo? É aquele que presta serviço ao seu senhor sem nada ter de direito.

Há duas outras palavras relacionadas ao conceito de ministérios. São elas, diaconia (diakonia) e liturgia (leiton-ergon). O diácono é aquele que serve a mesa. No Novo Testamento foi instituído para servir as viúvas e aos órfãos. A palavra liturgia significa: serviço prestado ao povo. Na sua origem é todo serviço público prestado em favor do povo. Somente mais tarde é que passou a ter um significado puramente religioso como serviço do culto prestado em favor do povo. Podemos ver claramente nestes dois termos a presença do conceito de serviço.

A Sagrada Escritura também nos fornece uma definição precisa de ministério. Em termos bíblicos, significa serviço prestado a Deus ou às pessoas, e a Bíblia o emprega para designar um
serviço assumido em caráter permanente e oficial. O Concílio Vaticano II reafirma o conceito de ministério como serviço prestado .

Tipologia dos ministérios na Igreja

Podemos distinguir diferentes grupos de ministérios na Igreja. Sabemos que os ministérios são suscitados pelo Espírito Santo para o bem do Corpo de Cristo que é a Igreja. E para que os ministérios possam estar a serviço de todos e para todos, há uma diversidade, de modo que a cada um é confiado um serviço específico. Na variedade de ministérios temos os seguintes grupos:

a) Ministérios reconhecidos: quando ligados a um serviço significativo para a comunidade, mas considerado não permanente, podendo vir a desaparecer, quando variarem as circunstâncias (ministérios litúrgicos entre outros);

b) Ministérios confiados: quando são conferidos ao seu portador por algum gesto litúrgico simples ou alguma forma canônica (ministérios extraordinários);

c) Ministérios instituídos: quando a função é conferida pela Igreja através de um rito litúrgico chamado “instituição” (leitorado e acolitado);

d) Ministérios ordenados: também chamados de ministérios apostólicos ou pastorais. Estes ministérios são conferidos através do sacramento da ordem, pelo rito litúrgico da ordenação (episcopado, presbiterado e diaconado).

Os ministérios derivados do Sacramento da Ordem

Os ministérios que derivam do sacramento da Ordem encontram-se na Igreja em primeiro lugar. Pela Ordem, Jesus Cristo continua a conferir aos pastores da Igreja (epíscopos, presbíteros e diáconos) a missão dos apóstolos. Constitui um verdadeiro serviço ministerial. Por meio do rito sacramental o portador destes ministérios recebem a autoridade e o poder sagrado para servirem a Igreja, agindo “in persona Christi Capitis”, ou seja, na pessoa de Cristo Cabeça. Estes ministérios ordenados antes de serem para aqueles que os recebem, são uma graça para a vida e missão da Igreja.

Embora o sacramento da Ordem possua três graus:

1. Primeiro grau – diaconado;
2. Segundo grau – presbiterado;
3. Terceiro grau – episcopado.

O sacerdócio ministerial possui apenas dois graus: o episcopado e o presbiterado. O diaconado não faz parte dos graus do sacerdócio ministerial. O sacerdócio ministerial está ordenado para o sacerdócio batismal de todo cristão.

Ministérios, ofícios e funções dos leigos

Por força e graça do batismo, os leigos participam, a seu modo, do múnus sacerdotal, profético e real de Jesus Cristo. Os ministérios, ofícios e funções que os leigos exercem na Igreja têm seu fundamento sacramental no Batismo e na Confirmação. Estes ministérios surgem conforme as necessidades da comunidade cristã e devem ser reconhecidos pelas autoridades da Igreja.

O Código de Direito ao tratar dos ministérios assumidos por leigos diz que "onde as necessidades da Igreja o aconselharem, por falta de ministros, os leigos, mesmo que não sejam leitores ou acólitos, podem suprir alguns ofícios, como os de exercer o ministério da Palavra, presidir às orações litúrgicas, conferir o Batismo e distribuir a Sagrada Comunhão, segundo as prescrições do direito" (CIC, cân. 230,3).

Diversidade dos ministérios leigos

O Concílio Vaticano II reconheceu uma pluralidade dos ministérios eclesiais de uma forma um pouco tímida. Somente depois é que se desenvolveu uma teologia dos ministérios mais globalizante de modo que não tratasse unicamente dos ministérios ordenados, mas abrangendo todos os ministérios, inclusive os assumidos pelos leigos.

Não basta apenas reconhecer os diversos ministérios exercidos pelos leigos, mas devem ser valorizados na sua diversidade. Não há uma vocação leiga única. Conforme admoestação de Pedro, na Igreja todos somos responsáveis uns pelos outros e pela evangelização. Todos são chamados a colocar seus dons (carismas) a serviço dos outros. “Todos vós, conforme o dom que cada um recebeu, consagrai-vos ao serviço uns dos outros” (Pd 4,10).

Podemos agrupar a diversidade dos ministérios leigos da seguinte maneira:

a) Ministério de Administração (conselho administrativo, pastoral do dízimo, comissão de eventos e promoções, etc.);

b) Ministério de Animação (animadores de comunidades, de grupos, etc.);

c) Ministério de Caridade (pastoral da caridade, vicentinos, pastoral da saúde, pastoral dos moradores de rua, etc.);

d) Ministério de Coordenação (coordenadores de pastorais, grupos, etc.);

e) Ministérios Litúrgicos (leitores, animadores, cantores, equipe de liturgia, salmistas, etc.);

f) Ministério da Palavra (catequistas, pregadores, educadores, animadores de grupos de rua, etc.);

g) Ministérios Pastorais (pastoral familiar, pastoral da juventude, etc.);

h) Ministérios dos Sacramentos (ministros extraordinários do batismo, ministros extraordinários da Sagrada Comunhão, da Bênção, da Palavra, etc.).

Concluindo

Fazer teologia dos ministérios é contemplar a diversidade dos ministérios eclesiais, onde todos se complementam. Não deve haver isolamento ou exclusividade, mas co-responsabilidade e complementariedade. O fundamento de todo ministério na Igreja é o próprio ministério de Jesus Cristo. Nosso serviço nada mais é do que levar adiante a obra por ele começada. Deste modo, desde cedo na Igreja houve uma grande variedade de ministérios e funções sempre voltados para o bem comum de toda a comunidade cristã. Queremos com nosso curso de teologia dos ministérios sistematizar e compreender a ministerialidade da Igreja e nossa missão em seu interior.


Pe. Cristiano Marmelo Pinto
Presbítero da Diocese de Santo André - SP, pároco na Paróquia Menino Jesus em São Bernardo do Campo - SP, Mestre em Teologia Sistemárica com Especialização em Liturgia pela PUC-SP, Especialista em Música Sacra pela Uni-FAI - São Paulo. Professor de Liturgia e Teologia dos Ministérios no Instituto de Teologia de Santo André.

Um comentário:

Anônimo disse...

Prezado irmão, gosto do seu blog, muito bom!

eis o meu : www.agnusincoaritanam.blogspot.com

Tambem estudei na Unifai. Assunção.