sexta-feira, 28 de outubro de 2011

O SACERDÓCIO COMUM E O
SACERDÓCIO MINISTERIAL


Prof. Ms. Pe. Cristiano Marmelo Pinto


Introdução

O cristão recebe do batismo uma condição sacramental que o torna membro da Igreja, povo sacerdotal. O Sacerdócio a que todo cristão é inserido pelo batismo nós o chamamos de sacerdócio batismal ou comum, que o faz participar do sacerdócio único de Cristo. Sua participação no sacerdócio de Cristo é exercida de modo preeminente através dos sacramentos e em especial da Eucaristia. A Constituição Dogmática Lumen Gentium sobre a Igreja afirma que

pela regeneração e pela unção do Espírito Santo, os batizados consagram-se para serem edifício espiritual e sacerdócio santo, a fim de, por meio de toda a sua atividade cristã, oferecerem sacrifícios espirituais e proclamarem as grandezas daquele que das trevas os chamou para a sua luz maravilhosa (LG 10ª).
O sacerdócio ministerial está ordenado para o sacerdócio batismal de todo cristão. A própria Constituição Dogmática Lumen Gentium deixa isso claro que, embora diferirem entre si na essência e não apenas em grau, um está ordenado para o outro, participando cada um a seu modo do único sacerdócio de Cristo (cf. LG 10b).

Nesta unidade de nosso curso queremos refletir sobre estas duas realidades do povo de Deus que se complementam e ordenam uma para a outra.

Cristo, o único Sacerdote

Em sua Carta aos Hebreus, Paulo explica claramente que Cristo é o grande sacerdote do Novo Testamento (cf. Hb 4,14-7,28). A Carta aos Hebreus afirma que nós cristãos temos um sacerdote, ou seja, um Sumo Sacerdote que é Jesus Cristo (cf. Hb 4,14). Em nenhum outro escrito do Novo Testamento encontramos esta qualificação de Jesus como Sumo Sacerdote. A primeira vista, a sua pessoa nada tem haver com o sacerdócio, segundo a concepção do Antigo Testamento e da prática judaica de seu tempo. Pelo contrário, sua missão mostra um caráter acentuadamente profético.

Com a doação de sua vida, oferecendo-se em sacrifício, Jesus torna-se ao mesmo tempo vítima e sacerdote. É o que encontramos em alguns textos do Novo Testamento onde é atestado o caráter sacrificial do ato de Cristo (cf. Mt 26-28; Mc 14,24; Jo 10,14-36; 1Cor 10,14-22). Porém, uma teologia do sacerdócio de Cristo só encontramos na Carta aos Hebreus. Nela os acontecimentos da vida de Cristo são relidos em chave sacrificial, cultual e sacramental. Na Carta aos Hebreus o sacerdócio de Cristo é apresentado numa nova perspectiva, que o torna diferente dos demais sacerdotes de sua época: a solidariedade do sumo e único sacerdote com os homens. Cristo, o Sumo Sacerdote torna-se deste modo solidário aos homens em tudo. É o que lemos na Carta: “Convinha, por isso, que em tudo se tornasse semelhante aos irmãos, para ser, em relação a Deus, sumo sacerdote misericordioso e fiel, para expiar assim os pecados do povo” (Hb 2,17). Com isto, Jesus afasta-se da visão sacerdotal do Antigo Testamento que estava ligado ao poder político (cf. Mc 4,7-8.24). O caminho seguido por Jesus é um itinerário de fé vivido no sofrimento da morte na cruz, único caminho para se chegar a verdadeira glória (cf. Hb 2,9). Em solidariedade com o destino dos homens, Jesus realiza a missão principal de seu sacerdócio: ser mediação entre Deus e o homem. O sacrifício oferecido por Cristo é único e definitivo (cf. Hb 7,27).

Podemos considerar algumas características do sacerdócio de Cristo segundo a Carta aos Hebreus.

a) Misericórdia (cf. Hb 2,17). Ao se tornar solidário com todos os homens em seu destino. Jesus assume e põe em prática uma atitude plena de misericórdia que quer salvar o pecador mediante o sacrifício de si;
b) O Sumo Sacerdote é fiel nas coisas que se referem a Deus. Jesus é fiel a Deus e possui uma relação de confiança com o Pai, tornando-se capaz de merecer a confiança de Deus a ponto de ser exaltado à sua direita (Hb 1,13; Sl 110);
c) O sacerdócio de Cristo tem caráter messiânico e universalista (cf. Hb 7; Sl 110). Jesus é sacerdote segundo a ordem de Melquisedec (cf. Hb 6,20). Isto mostra a superioridade do sacerdócio de Jesus sobre o sacerdócio levítico de Israel.

O Sacerdócio batismal dos cristãos

Na história da Igreja, o Concílio Vaticano II foi o primeiro a tratar da questão do sacerdócio batismal ou comum dos cristãos. Na Constituição Dogmática Lumen Gentium temos uma profunda teologia da incorporação à Igreja por meio do batismo por meio do qual o cristão participa do sacerdócio de Cristo (cf. LG 10). Esta vinculação é exercida pelos sacramentos em especial batismo-confirmação-eucaristia (cf. LG 11). Mas o cristão vive seu sacerdócio em todos os demais sacramentos.

Encontramos no Antigo Testamento a afirmação de que Deus disse ao povo de Israel: “Vós sereis para mim um reino de sacerdotes e uma nação santa” (Ex 19,6). Jesus realizando esta vocação do povo de Deus constituiu o novo povo sacerdotal, fundado através de seu ato redentor (cf. Ap 1,6; 5,9-10). O fundamento deste sacerdócio é o batismo (cf. LG 31a, 14; AA 3; UR 3) é descrito pelo Concílio Vaticano II em suas quatro funções: a) o batizado é incorporado a Cristo e sua missão; b) é constituído fiel cristão, membro da Igreja, povo de Deus; c) é feito testemunha de Cristo no mundo e d) é destinado para a salvação definitiva por sua condição.

Pelo batismo o cristão é inserido na tríplice missão de Cristo: sacerdotal, profética e régia. Toda ação ministerial da e na Igreja se estrutura em torno desta tríplice missão de Jesus Cristo. Vejamos:

a) Função sacerdotal (cf. LG 34). O leigo participa desta função de acordo com o que é expresso em LG 10 sobre o sacerdócio batismal. A este sacerdócio está ordenado o ministerial. Enquanto que o sacerdócio batismal comporta uma vida entendida como “oferta essencial”, o sacerdócio ministerial comporta a representação sacramental da mediação de Cristo cabeça;
b) Função profética (cf. LG 35). O caráter profético da vida do cristão está inserido na necessidade de professar a fé na vida cotidiana e secular, dando ênfase a vida matrimonial e familiar;
c) Função régia (cf. LG 36). Esta função insere o cristão na missão régia de Cristo. O caráter real da vida cristã não se trata de dominação, mas de “serviço régio”, para difundir o Reino de Deus entre todas as criaturas. Aqui se trata da função dos cristãos transformar as realidades do mundo implantando o Reino de Deus entre os homens, ou seja, modificar as estruturas.

Segundo Cardeal Martins “o caráter batismal tem, antes de mais, uma dimensão sacerdotal, porquanto, ao inserir vitalmente em Cristo e na Igreja, torna partícipe do sacerdócio daquele e desta” (MARTINS, 2002, p. 90). Este caráter faz do cristão um povo sacerdotal. A primeira Carta de Pedro sublinha o fato de os cristãos representarem um sacerdócio real (cf. 1Pd 2,4-10). Também João atribui aos cristãos a dignidade sacerdotal por terem sidos redimidos por Cristo (cf. Ap 1,6). Para Paulo a dignidade sacerdotal do cristão está no fato de ser templo de Deus (cf. 1Cor 3,16-17).

Na patrística encontramos testemunhos de alguns Padres da Igreja que atestam o caráter sacerdotal do povo cristão. Para Santo Irineu o cristão tem a dignidade sacerdotal. Segundo Origines toda a Igreja e, portanto, todo o povo cristão é conferido sacerdote. São João Crisóstomo exalta a dignidade sacerdotal dos cristãos. Para Santo Ambrósio todos os membros da Igreja são sacerdotes.

Na Idade Média encontramos o testemunho de Pedro Damião que diz que, mediante a graça de Cristo, cada cristão torna-se sacerdote. Porém, foi Santo Tomás de Aquino que deu um grande impulso à doutrina do sacerdócio batismal, com suas afirmações sobre o caráter sacramental. Com a Reforma Protestante, Lutero deu preferência ao sacerdócio batismal dos cristãos em detrimento ao sacerdócio ministerial. Com isso, após o Concílio de Trento, foi reforçado o pensamento e doutrina da Igreja a respeito do sacerdócio ministerial ou hierárquico, relegando ao sacerdócio batismal um segundo plano e no decorrer do tempo, este caiu quase no esquecimento, voltando a tona com o Concílio Vaticano II.

O sacerdócio ministerial

A Constituição Dogmática sobre a Igreja Lumen Gentium, n. 10b afirma que há uma diferença entre o sacerdócio batismal e o sacerdócio ministerial, não apenas em grau, mas também em essência. Porém eles ordenam-se um para o outro e o primeiro é fundamento para o segundo. Este documento é o primeiro do Concílio Vaticano II que se pronuncia a respeito do sacerdócio batismal relacionando-o ao sacerdócio ministerial.

Enquanto o sacerdócio comum dos fiéis se realiza no desenvolvimento da graça batismal, na vida de fé, de esperança e de caridade, segundo o Espírito, o sacerdócio ministerial ou ordenado está a serviço do sacerdócio comum, referindo-se ao desenvolvimento da graça do batismo de todos os cristãos (GOEDERT, 2006, p. 27).

O sacerdócio ministerial define-se em relação a Cristo cabeça e o seu corpo, a Igreja. O sacerdócio ministerial age in persona Christi capitis, ou seja, na pessoa de Cristo Cabeça. Isto o permite agir não somente em nome de Jesus Cristo, mas também em nome da Igreja. Porém jamais substitui Cristo. O ministério ordenado torna visível a presença de Cristo enquanto Cabeça da Igreja.

O sacerdócio ministerial é conferido pelo sacramento da ordem, porém, tem seu fundamento no sacramento do batismo, condição insubstituível para o sacerdócio ministerial. O sacerdócio batismal é permanente e não é substituído pelo sacerdócio ministerial, pelo contrário, este último está ordenado em função do primeiro e só pode existir por causa do sacerdócio batismal de todo cristão. Conforme Dionísio Borobio “o ministério ordenado não é somente uma função, é um sacramento da Igreja, que significa e expressa a consagração e a destinação de um membro capacitado e eleito pela Igreja para presidir a comunidade cristã e a Eucaristia” (BOROBIO, 2009, p. 406).

Para concluir: o exercício do sacerdócio comum...

O cristão exerce o sacerdócio batismal de muitos modos. Exerce-o participando ativamente da celebração da Eucaristia, que constitui o centro da vida cristã. Esta participação é real. É uma participação ativa, consciente e frutuosa. Exerce-o na Igreja, povo sacerdotal, como membro do Corpo de Cristo. A Eucaristia é a celebração do Christus Totus (Cristo total): Cabeça e membros. Em segundo lugar, o cristão exerce o sacerdócio batismal recebendo os demais sacramentos e vivendo uma vida cristã na busca da santidade. A vida cristã tem sua continuidade na vida cotidiana que deve ser uma entrega constante ao Pai. A Constituição Dogmática Lumen Gentium diz que: “os fiéis, incorporados na Igreja pelo batismo, recebem o caráter que os delega para o culto cristão, e, renascidos como filhos de Deus, são obrigados a professar diante dos homens a fé que pela Igreja receberam de Deus” (LG 11).



Referência Bibliográfica

VANHOYE, Albert. Sacerdotes antigos e sacerdote novo: segundo o Novo Testamento. São Paulo: Academia Cristã, 2007, pp. 377-480.

PIE-NINOT, Salvador. Introdução à eclesiologia. São Paulo: Loyola, 1998, pp. 59-73.

CONGAR, Yves M.-J. Os leigos na Igreja: escalões para uma teologia do laicato. São Paulo: Herder, 1966, pp. 161-329.

LEMAIRE, André. Os ministérios na Igreja. São Paulo: Paulinas, 1977, pp. 96-99.

BEDIM, José. O sacerdócio cristão: estudo histórico - teológico – pastoral. São Paulo: O Recado, 1992.

MARTINS, Cardeal José Saraiva. Baptismo e crisma. Lisboa: Universidade Católica Editora, 2002.

BOROBIO, Dionísio. Celebrar para viver: liturgia e sacramentos da Igreja. São Paulo: Loyola, 2009.

GOEDERT, Valter Maurício. Ordem e ministérios: a serviço da comunhão. São Paulo: Paulinas, 2006




Pe. Cristiano Marmelo Pinto
Presbítero da Diocese de Santo André - SP, pároco na Paróquia Menino Jesus em São Bernardo do Campo - SP, Mestre em Teologia Sistemárica com Especialização em Liturgia pela PUC-SP, Especialista em Música Sacra pela Uni-FAI - São Paulo. Professor de Liturgia e Teologia dos Ministérios no Instituto de Teologia de Santo André.

TEOLOGIA DOS MINISTÉRIOS

Pe. Cristiano Marmelo Pinto

Por que uma teologia dos ministérios?

Até a algum tempo atrás, falar de ministérios era abordar praticamente o sacramento da ordem em seus graus (episcopado, presbiterado, diaconado). Graças a renovação da Igreja ocorrida principalmente no Concílio Vaticano II, passou-se a abordar a diversidade dos ministérios eclesiais e não somente os ministérios ordenados. Isto porque na Igreja não existe apenas os ministérios ordenados, mas uma diversidade de ministérios leigos de igual modo importantes para a evangelização. Dentre tantos encontramos os ministérios de leitores, acólitos, catequistas, os ministérios extraordinários, etc.

O resgate do protagonismo dos leigos na Igreja certamente foi fundamental para que fosse revisto o conceito de ministérios que perdurou por longos séculos na Igreja, resgatando a teologia do sacerdócio batismal (comum) e redimensionando o sacerdócio ministerial (bispos e padres), bem como recuperando a riqueza do diaconado permanente e sua missão no contexto eclesial.

A teologia dos ministérios eclesiais se desenvolveu principalmente depois do Concílio Vaticano II com uma nova abordagem da eclesiologia, agora não mais centrada na estrutura hierárquica e piramidal da Igreja, mas sim, tendo a Igreja como Povo de Deus, onde todos, dentro da sua especificidade, colaboram com a missão da Igreja de levar a salvação a todos os homens e mulheres desta terra.

Os ministérios são um problema eclesiológico e não apenas uma questão funcional. É um problema de estrutura e manifestação da Igreja. Tem haver com a sua própria identidade. Neles estão implicados o ser e o aparecer da Igreja no cumprimento de sua missão no mundo. Deste modo, podemos dizer que a imagem que se tem da Igreja influirá na concepção dos ministérios e por outro lado, a configuração dos ministérios eclesiais depende do modelo de Igreja que se segue.

Por trás de uma concepção dos ministérios há sempre uma concepção de Igreja. Se se tiver uma concepção de Igreja mais “hierárquica-institucional”, que acentue o poder e a autoridade hierarquicamente diante da participação e da diversidade de carismas, vir-se-á a ter uma concepção de ministério mais centralizada, em que o clero é o que sabe, ordena e decide, ficando os ministérios leigos relegados à simples colaboração executiva .

Para uma verdadeira e fiel teologia dos ministérios é necessário seguir outra vertente, proposta pelo Concílio Vaticano II, numa linha de Igreja como “comunhão e participação”, onde os leigos assumem seu protagonismo na evangelização. Deste modo é possível falar de co-responsabilidade, de co-participação e consequentemente de diversidade de ministérios assumidos pelos leigos e leigas na ação eclesial.

Evidentemente que esta concepção de Igreja não desmerece a importância e a necessidade dos ministérios ordenados, mas forma uma complementaridade onde ministros ordenados e ministros leigos caminham juntos, se ajudam na construção do Reino de Deus.

Por este motivo, conceber uma teologia dos ministérios é assumir a diversidade dos ministérios no interior da Igreja e não mais utilizar o singular, mas o plural. Não mais apenas ter como verdadeiros ministérios os ordenados, mas também os não-ordenados, assumidos por leigos e leigas na obra da evangelização.

Os ministérios na missão da Igreja

Falar de ministérios é falar da própria missão da Igreja, pois, todos os ministros estão a serviço da missão que a Igreja recebeu de Jesus Cristo.

Jesus cumpriu a missão que recebeu do Pai, levando ao pleno cumprimento em sua paixão, morte e ressurreição. Porém, ele sabia que esta obra, que sua missão deveria chegar a todos os homens e mulheres deste mundo até a parusia. Por isso, ele constituiu os doze confiando a eles a continuidade de sua missão. Esta continuação da missão de Jesus Cristo é assegurada com o envio do Espírito Santo, fazendo com que a Igreja nascente se manifestasse ao mundo e levasse a todos a boa notícia do Reino.

A missão de Cristo é fundante e originante, enquanto que a missão da Igreja é continuadora da missão de Cristo. Podemos dizer que a missão da Igreja é:

a) Continuadora – porque prolonga na história o que o próprio Jesus Cristo realizou;

b) Referente – porque tem seu sentido e referência em Jesus;

c) Realizante – porque a Igreja deve atualizar e promover a salvação que Jesus Cristo nos trouxe;

d) Impulsionante – porque deve promover o Reino de Deus até o fim dos tempos.

A missão da Igreja tem as mesmas dimensões e características da missão de Jesus Cristo:

a) Dimensão profética ou da palavra (martyría);

b) Dimensão sacerdotal ou da liturgia (leitourgía);

c) Dimensão da caridade e da justiça (diakonia);

d) Dimensão da comunhão e da unidade (koinonía).

Da missão de Jesus Cristo nascem e fundamentam-se as diversas dimensões da missão que concentram em torno de si a diversidade de ministérios. Em torno da missão de Cristo a diversidade de ministérios encontra sua unidade. O Concílio Vaticano II afirma que: “existe na Igreja diversidade de ministérios, mas unidade de missão” . Esta unidade está no cumprimento da missão herdade de Jesus.

A missão de Jesus compromete a todos os membros da Igreja, todo o povo de Deus. Como afirmam os padres conciliares: “não existe assim membro que não tenha parte na missão de todo o Corpo” . Nela todos participam sejam os ministros ordenados e os não-ordenados (cf. AA 2).

Os ministérios afetam toda a Igreja como constitutivo de seu próprio ser e missão, ou seja, a Igreja não apenas possui ministérios, mas ela é toda ministerial, deve estar constantemente a serviço do Reino de Deus. Embora haja diferentes ministérios na Igreja, isso não significa que sejam exclusivos, pois os ministérios estão na Igreja para o cumprimento de sua ministerialidade.

Podemos concluir que por serem constitutivos da essência da Igreja, os ministérios não são exclusividades, mesmo os ordenador. Isto nos faz concluir igualmente que os ministérios na Igreja não são meras funções secundárias na sua missão, mas essenciais à Igreja. Eles não são acidentais a Igreja, mas fazem parte da sua estrutura.

Para realizar sua missão, a Igreja precisa dos ministérios e isto acontece do seguinte modo:

1) Relação acontecimento salvífico: continuidade histórica: em sua missão a Igreja dá continuidade à missão salvífica de Jesus Cristo. Ela é a mediação fundamental e cumpre esta missão através dos ministérios;
2) Relação missão – dimensões da missão: a diversidade de dimensões da missão de Jesus Cristo exige de igual modo a diversidade de ministérios;
3) Relação Espírito Santo – dons e carismas do Espírito: o Espírito Santo é a alma da missão da Igreja. Ele é princípio de unidade e ao mesmo tempo de diversidade. Todo ministério nasce de um carisma e supõe um carisma que nem sempre é idêntico;
4) Relação “alguns” – “todos”: desde cedo no Novo Testamento aparece “alguns” que receberam uma missão específica em relação a “todos”, mas não significa exclusividade, pelo contrário, pressupõe a diversidade ministerial;

Ao dizermos que os ministérios são um elemento constitutivo da Igreja, significa que também deve ser para a comunidade de forma concreta. Os ministérios devem ser entendidos não por cima da Igreja, mas no seu interior. A comunidade existe ministerialmente. Os ministérios não são um fim em si mesmos, mas um meio que deve concretizar-se a partir das necessidades da comunidade. Portanto, é preciso sempre partir das necessidades reais da comunidade para o surgimento dos ministérios em seu interior, e quem os suscita é o Espírito Santo.

Mas afinal, o que é ministério?

A palavra ministério vem do latim “ministerium” e significa o “ofício próprio do servo”, uma função de serviço. Devemos entender os ministérios a partir do sentido de servisalidade. Quem é o servo? É aquele que presta serviço ao seu senhor sem nada ter de direito.

Há duas outras palavras relacionadas ao conceito de ministérios. São elas, diaconia (diakonia) e liturgia (leiton-ergon). O diácono é aquele que serve a mesa. No Novo Testamento foi instituído para servir as viúvas e aos órfãos. A palavra liturgia significa: serviço prestado ao povo. Na sua origem é todo serviço público prestado em favor do povo. Somente mais tarde é que passou a ter um significado puramente religioso como serviço do culto prestado em favor do povo. Podemos ver claramente nestes dois termos a presença do conceito de serviço.

A Sagrada Escritura também nos fornece uma definição precisa de ministério. Em termos bíblicos, significa serviço prestado a Deus ou às pessoas, e a Bíblia o emprega para designar um
serviço assumido em caráter permanente e oficial. O Concílio Vaticano II reafirma o conceito de ministério como serviço prestado .

Tipologia dos ministérios na Igreja

Podemos distinguir diferentes grupos de ministérios na Igreja. Sabemos que os ministérios são suscitados pelo Espírito Santo para o bem do Corpo de Cristo que é a Igreja. E para que os ministérios possam estar a serviço de todos e para todos, há uma diversidade, de modo que a cada um é confiado um serviço específico. Na variedade de ministérios temos os seguintes grupos:

a) Ministérios reconhecidos: quando ligados a um serviço significativo para a comunidade, mas considerado não permanente, podendo vir a desaparecer, quando variarem as circunstâncias (ministérios litúrgicos entre outros);

b) Ministérios confiados: quando são conferidos ao seu portador por algum gesto litúrgico simples ou alguma forma canônica (ministérios extraordinários);

c) Ministérios instituídos: quando a função é conferida pela Igreja através de um rito litúrgico chamado “instituição” (leitorado e acolitado);

d) Ministérios ordenados: também chamados de ministérios apostólicos ou pastorais. Estes ministérios são conferidos através do sacramento da ordem, pelo rito litúrgico da ordenação (episcopado, presbiterado e diaconado).

Os ministérios derivados do Sacramento da Ordem

Os ministérios que derivam do sacramento da Ordem encontram-se na Igreja em primeiro lugar. Pela Ordem, Jesus Cristo continua a conferir aos pastores da Igreja (epíscopos, presbíteros e diáconos) a missão dos apóstolos. Constitui um verdadeiro serviço ministerial. Por meio do rito sacramental o portador destes ministérios recebem a autoridade e o poder sagrado para servirem a Igreja, agindo “in persona Christi Capitis”, ou seja, na pessoa de Cristo Cabeça. Estes ministérios ordenados antes de serem para aqueles que os recebem, são uma graça para a vida e missão da Igreja.

Embora o sacramento da Ordem possua três graus:

1. Primeiro grau – diaconado;
2. Segundo grau – presbiterado;
3. Terceiro grau – episcopado.

O sacerdócio ministerial possui apenas dois graus: o episcopado e o presbiterado. O diaconado não faz parte dos graus do sacerdócio ministerial. O sacerdócio ministerial está ordenado para o sacerdócio batismal de todo cristão.

Ministérios, ofícios e funções dos leigos

Por força e graça do batismo, os leigos participam, a seu modo, do múnus sacerdotal, profético e real de Jesus Cristo. Os ministérios, ofícios e funções que os leigos exercem na Igreja têm seu fundamento sacramental no Batismo e na Confirmação. Estes ministérios surgem conforme as necessidades da comunidade cristã e devem ser reconhecidos pelas autoridades da Igreja.

O Código de Direito ao tratar dos ministérios assumidos por leigos diz que "onde as necessidades da Igreja o aconselharem, por falta de ministros, os leigos, mesmo que não sejam leitores ou acólitos, podem suprir alguns ofícios, como os de exercer o ministério da Palavra, presidir às orações litúrgicas, conferir o Batismo e distribuir a Sagrada Comunhão, segundo as prescrições do direito" (CIC, cân. 230,3).

Diversidade dos ministérios leigos

O Concílio Vaticano II reconheceu uma pluralidade dos ministérios eclesiais de uma forma um pouco tímida. Somente depois é que se desenvolveu uma teologia dos ministérios mais globalizante de modo que não tratasse unicamente dos ministérios ordenados, mas abrangendo todos os ministérios, inclusive os assumidos pelos leigos.

Não basta apenas reconhecer os diversos ministérios exercidos pelos leigos, mas devem ser valorizados na sua diversidade. Não há uma vocação leiga única. Conforme admoestação de Pedro, na Igreja todos somos responsáveis uns pelos outros e pela evangelização. Todos são chamados a colocar seus dons (carismas) a serviço dos outros. “Todos vós, conforme o dom que cada um recebeu, consagrai-vos ao serviço uns dos outros” (Pd 4,10).

Podemos agrupar a diversidade dos ministérios leigos da seguinte maneira:

a) Ministério de Administração (conselho administrativo, pastoral do dízimo, comissão de eventos e promoções, etc.);

b) Ministério de Animação (animadores de comunidades, de grupos, etc.);

c) Ministério de Caridade (pastoral da caridade, vicentinos, pastoral da saúde, pastoral dos moradores de rua, etc.);

d) Ministério de Coordenação (coordenadores de pastorais, grupos, etc.);

e) Ministérios Litúrgicos (leitores, animadores, cantores, equipe de liturgia, salmistas, etc.);

f) Ministério da Palavra (catequistas, pregadores, educadores, animadores de grupos de rua, etc.);

g) Ministérios Pastorais (pastoral familiar, pastoral da juventude, etc.);

h) Ministérios dos Sacramentos (ministros extraordinários do batismo, ministros extraordinários da Sagrada Comunhão, da Bênção, da Palavra, etc.).

Concluindo

Fazer teologia dos ministérios é contemplar a diversidade dos ministérios eclesiais, onde todos se complementam. Não deve haver isolamento ou exclusividade, mas co-responsabilidade e complementariedade. O fundamento de todo ministério na Igreja é o próprio ministério de Jesus Cristo. Nosso serviço nada mais é do que levar adiante a obra por ele começada. Deste modo, desde cedo na Igreja houve uma grande variedade de ministérios e funções sempre voltados para o bem comum de toda a comunidade cristã. Queremos com nosso curso de teologia dos ministérios sistematizar e compreender a ministerialidade da Igreja e nossa missão em seu interior.


Pe. Cristiano Marmelo Pinto
Presbítero da Diocese de Santo André - SP, pároco na Paróquia Menino Jesus em São Bernardo do Campo - SP, Mestre em Teologia Sistemárica com Especialização em Liturgia pela PUC-SP, Especialista em Música Sacra pela Uni-FAI - São Paulo. Professor de Liturgia e Teologia dos Ministérios no Instituto de Teologia de Santo André.
ANO LITÚRGICO:
A CELEBRAÇÃO DO MISTÉRIO DE CRISTO NO TEMPO


Pe. Cristano Marmelo Pinto*



1. Introdução

Como sabemos o ano civil possui 365 dias. Também o comércio possui o seu ano, que é constituído de 360 dias. No decorrer do ano nós realizamos nossos anseios, nossos projetos e em determinados dias recordamos acontecimentos marcantes de nossa vida, por exemplo, o nosso aniversário e outros acontecimentos. Também durante o ano civil recordamos fatos que marcaram a História como o descobrimento do Brasil, a Independência, Proclamação da República, Tiradentes, etc. Dedicamos também alguns dias para homenagear pessoas importantes, como por exemplo, dias das mães, dos pais, das mulheres, das secretárias, etc. E as coisas que fazem parte de nossa vida, dia do livro, da paz, o trabalho, etc. Tudo isso nos faz recordar o passado e ao mesmo tempo nos lança à frente para alcançar alguma meta, trabalho justo para todos, a paz mundial, felicidade... A Igreja também sentiu a necessidade de relembrar os acontecimentos da vida de Cristo. Para isso foi estabelecendo dias específicos para tais recordações. Diferente do ano civil e do ano comercial, a Igreja formou ao longo de sua História um ciclo próprio onde pudesse ser recordado a obra salvífica de Cristo. Desta necessidade surgiu o Ano Litúrgico, o ano da Igreja. Nele celebramos o Mistério de Cristo, Senhor da história. Cristo é seu centro e tudo gira em torno dele. Mesmo quando celebramos Nossa Senhora, os Mártires e os santos. Se lembramos deles é porque foram fiéis seguidores de Cristo e associaram suas vidas a vida e paixão de Cristo.

2. Desenvolvimento Histórico do Ano Litúrgico

O Ano Litúrgico foi se desenvolvendo ao longo da história da Igreja. Ele foi surgindo aos poucos, fase por fase, tempo por tempo. No início, nas primeiras comunidades cristãs, somente existia a festa da Páscoa. Esta festa era celebrada todos os domingos, dia em que o Senhor havia ressuscitado. Não havia um dia específico para esta festa, todo domingo era a festa da Páscoa. Nele recordavam a morte e ressurreição do Senhor Jesus. Como nos diz Bergamini: “No primeiro período da história da Igreja, a Páscoa foi o único centro da pregação, da celebração e da vida cristã. O culto da Igreja nasceu da Páscoa e para celebrar a Páscoa.” A festa, a celebração, o encontro semanal dos cristãos era no domingo, como nos atesta São Justino em sua Apologia: “No dia chamado do Sol...” O domingo não tinha outra demoninação além das que já vimos no capítulo anterior. Não tinha o domingo da quaresma, da páscoa, do tempo comum, etc. Estes vieram bem depois. Como já vimos, todo domingo era Páscoa, celebração semanal da morte e ressurreição do Senhor Jesus. Bem cedo, a Igreja deu à um desses domingos um caráter todo especial. Este seria aquele que se recordaria a primeira Páscoa. Assim surgiu o domingo da Páscoa, diferente de todos os outros, caracterizado de total solenidade, a Páscoa das páscoas. Porém os demais domingos conservaram o caráter pascal. O único elemento fundante desta celebração era o Mistério de “Cristo crucificado, sepultado, ressuscitado.” Por influência da comunidade cristã de Jerusalém, começou a prevalecer o critério da historicização, isto é, queriam reviver historicamente a paixão, morte e ressurreição do Senhor. Deste desejo nasceu a Semana Santa. Como nos atesta Bergamini: “ao redor deste núcleo (celebração anual da Páscoa de Cristo), vai-se formando o Tríduo Pascal que celebra a morte de Cristo (sexta feira santa), a sua sepultura (sábado santo), a sua ressurreição (domingo, com a grande vigília).” A Quinta feira santa estava reservada para recordar a instituição da eucaristia. “Quando a ressurreição de Cristo foi celebrada no sábado, a Quinta feira santa passou a ser o primeiro dia do Tríduo Pascal que compreendia então a quinta, a sexta e o sábado.” Já bem cedo acrescentou-se um período de preparação de cinco a seis domingos (quaresma), e também acrescentou-se um prolongamento de cinqüenta dias, sendo que no quadragésimo dia recorda-se a Ascensão do Senhor e culmina no qüinquagésimo com o Pentecostes. Todo este conjunto da celebração da Páscoa do Senhor estava pronto pelos séculos IV e V.
Com o passar do tempo, os cristãos decidiram-se festejar também o nascimento de Cristo. Porém, não sabiam em que dia exatamente Jesus Cristo havia nascido. Isto se justifica pelo fato de que, naquele época não tinham o costume de fazer o registro de nascimento das pessoas como se faz hoje. Por isso, era muito comum esquecerem a data do nascimento de uma pessoa. Então surgiu uma questão: em que dia celebrar o nascimento de Cristo?
Havia naquela época uma festa dos pagãos que celebravam o nascimento do sol. Esta festa era celebrada em Roma no dia 25 de dezembro e no Egito no dia 6 de janeiro. Para os pagãos o sol era considerado um deus.
Por volta do ano 350 os cristãos que já eram a maioria, decidiram substituir esta festa pelo nascimento de Cristo, o Sol verdadeiro, a Luz do mundo. No Ocidente, no dia 25 de dezembro começaram a celebrar o Natal e no Oriente celebravam no dia 6 de janeiro a Epifania do Senhor. Logo estas duas celebrações se juntaram e na festa da Epifania passou-se a celebrar o Batismo. Não passou muito tempo para acrescentarem um período de preparação. Este período era chamado de Advento. “Assim, o Ano Litúrgico tem, fundamentalmente, dois ciclos: o da Páscoa - o mais importante - e o de Natal. Cada um tem uma preparação, a celebração e o prolongamento.”
O Culto a Maria desenvolveu-se a partir do Concílio de Éfeso, no ano 431. É posterior ao culto dos mártires, que é antiquíssimo e está relacionado diretamente ao mistério pascal de Cristo. Maria é celebrada por sua íntima e profunda participação na obra co-Redentora de Cristo. Celebra-se os santos porque estes de uma forma ou de outra viveram o mistério de Cristo, com ele sofreram e por ele deram suas vidas.

3. Finalidade do Ano Litúrgico

A natureza e a finalidade do Ano Litúrgico é celebrar a obra Redentora de Cristo. Na liturgia torna-se presente o mistério Pascal de Cristo para que nós possamos participar de sua vida e doar-nos à Deus e aos irmãos. “A finalidade do Ano Litúrgico, no seu conjunto e na seqüência de ações litúrgicas, é fazer viver na fé o mistério da história da salvação, tornada presente justamente por meio da liturgia.”
“A Igreja, vivendo no tempo, já experimenta a eternidade, vivendo anualmente o mistério de Cristo. Nos mistérios da manifestação de Cristo no ciclo de Natal, o cristão vive sua vocação à comunhão com Deus. Sofre e morre com ele na Semana Santa e com ele vence a morte para viver a vida nova de ressuscitado em Cristo, vida esta fecundada pelo espírito de Pentecostes, para crescer e dar muito fruto e assim encontrar-se com o Cristo que há de vir. E comemorando os santos, ele espera participar de sua glória. Em Cristo a Igreja já vive o que espera e aviva sempre de novo sua esperança na glória a se revelar um dia.”

4. A Reforma do Ano Litúrgico no Concílio Vaticano II

A constituição sobre a liturgia Sacrosanctum Concilium do Vat. II, ao estabelecer a reforma geral da liturgia, no que diz respeito ao Ano Litúrgico, havia disposto que ele “fosse revisto de modo que, conservados ou restituídos os usos e os ordenamentos tradicionais dos tempos sagrados segundo as condições de hoje, fosse mantido o seu caráter original para alimentar devidamente a piedade dos fiéis na celebração dos mistérios da redenção cristã, mas principalmente na celebração do mistério pascal. As atenções dos fiéis sejam dirigidas primordialmente para as festas do Senhor, nas quais se celebram, durante o ano, os mistérios da salvação. Por isso, o próprio do tempo deve ter o seu justo lugar acima das festas dos santos, a fim de que o ciclo integral dos mistérios da salvação seja convenientemente recordado.”
Já Pio X e João XXIII haviam elaborado disposições com o objetivo de “restituir ao domingo a sua dignidade original, de modo que fosse considerado por todos como a festa primordial, e igualmente visando a restaurar e restabelecer a celebração litúrgica da quaresma.” E Pio XII havia “decretado que se fizesse reviver, durante a noite pascal, a solene vigília, em que o povo de Deus, celebrando os sacramentos da iniciação cristã, renova a sua aliança espiritual com o Cristo Senhor ressuscitado.” Tudo isto encontrou agora o seu coroamento na Instrução Geral sobra o Missal Romano promulgada por Paulo VI com o motu proprio Mysterii paschalis de 14 de fevereiro de 1969, como realização e entrada em vigor das disposições dadas pelo Vaticano II.”
A reforma foi inspirada por critério teológico-pastoral de autêntica tradição e de simplificação. Ela promoveu uma restruturação mais lógica e orgânica, clara e linear que evitasse a duplicação de festas e sobretudo exprimisse a centralidade do mistério de Cristo com o seu vértice na época.

A reforma, portanto, estabeleceu os seguintes pontos principais:
1. O domingo é a festa primordial e, como tal, deve ser respeitado e proposto à piedade dos fiéis (SC 106);
2. O próprio do tempo, ou a celebração de todos os mistérios de Cristo tendo como centro o mistério pascal, ocupa o primeiro lugar;
3. As festas dos santos para toda a Igreja são reduzidas às dos santos de importância verdadeiramente universal (SC 111).

É importante termos presente que no santoral deve ser sempre celebrado o próprio mistério de Cristo, visto nos seus frutos, realizado nos seus membros mais configurados com o Senhor morto e ressuscitado e, sobretudo, em Maria, ‘o fruto mais excelso da redenção’ (SC 103-104).

5. O Ciclo do Natal

O Ciclo do Natal é o tempo em que a Igreja celebra o mistério da Salvação revelado na Encarnação do Senhor e na sua manifestação aos povos. Este Ciclo é composto de um período de preparação, a festa e um tempo de prolongamento.

Preparação: Advento ( 4 domingos )
Festa: Natal / Oitava de Natal
Prolongamento: Mãe de Deus / Epifania / Batismo



5.1 Advento

O termo “advento” (adventus) é uma palavra de origem pagã, que “do ponto de vista cultual significava a vinda anual da divindade em seu templo para visitar seus fiéis.” Sua origem tem início no século IV na região da Gália e Espanha. Nestas regiões os cristãos viram a necessidade de uma preparação para a festa do Natal/Epifania. Esta preparação tinha a duração de três semanas.
O advento romano somente veio a surgir a partir da segunda metade do século VI. Enquanto o advento da Gália e Espanha possuía um aspecto ascético, o advento romano foi desde a sua origem, uma instituição litúrgica.
O advento é um tempo de preparação para a Solenidade do Natal do Senhor. O advento cristão “caracteriza-se por lembrar a longa espera da humanidade pela vinda de Cristo, por preparar-nos para seu novo nascimento, e pela alegre esperança de sua volta gloriosa, no fim dos tempos.”
No advento, o presente, o passado e o futuro estão bem vivos. O passado aparece na figura do profeta Isaías, o presente está simbolizado em Maria, e João Batista nos chama a atenção para a implantação do Reino definitivo no fim dos tempos.
“Neste tempo devemos ter presente sempre as três vindas do Senhor Jesus. A vinda na história, preparada pelo Povo eleito do Antigo Testamento; a vinda no sacramento, ou mistério celebrado para cada geração que, nele crendo, aguarda a sua vinda; e a última vinda gloriosa, quando submeterá ao Pai o reino eterno e universal.
Estas três vindas estão intimamente relacionadas entre si. Comemorando sua vinda histórica no passado, estamos vivenciando sua vinda no presente. E cada vinda sua no presente constitui um passo ou um degrau na preparação de sua vinda definitiva na glória futura.”

4.2 Natal e Epifania

Como já sabemos, o Natal tem sua origem na substituição da festa do sol, dos pagãos, pela comemoração do nascimento de Jesus. Esta substituição teve muita aceitação entre os cristãos porque combatia uma heresia que negava que Jesus Cristo fosse realmente Deus. O sol nos fins de dezembro começa a brilhar mais. Cristo, que é o Sol eterno, trouxe luz nova para a humanidade com seu nascimento. “Por isso o Natal é mais do que o aniversário natalício de Jesus: celebra-se neste dia o fato de que Deus se fez homem, que o Filho de Deus tornou-se filho de Maria e nosso irmão.”
O termo “epifania” de origem grega, tem o significado de autonotificação. Significa também a visita do imperador a uma cidade. Para os pagãos, epifania significava “a aparição de uma divindade ou de sua intercessão prodigiosa.”
Sua origem, anterior ao Natal, dá-se pelo mesmo motivo da instituição do Natal: para celebrar o mistério da encarnação do Senhor. Como nos diz Bergamini: “As duas festas, Natal e Epifania, constituíam uma única festa que tinha um único objetivo: a encarnação do Verbo, celebrada, porém, com acentuação, denominação e datas diferentes no Oriente e no Ocidente.”
Com o passar do tempo, o Oriente e o Ocidente juntaram estas duas festas. No Natal, dia 25 de dezembro, celebra-se o nascimento de Cristo e na Epifania, dia 6 de janeiro, a manifestação de Cristo ao mundo.
O Batismo faz parte das festas “epifânicas”, ou seja, das festas da manifestação do Senhor. “Na festa do Batismo de Cristo se manifesta a missão messiânica de Jesus como Filho muito amado do Pai, como sacerdote, rei e profeta. Constitui como que um pequeno Pentecostes.” Porém, mesmo fazendo parte das festas da manifestação do Senhor, com o Batismo inicia-se o tempo comum.
A oitava de Natal é um período de prolongamento da festa do Natal. Ela se conclui com a solenidade de Maria Santíssima, Mãe de Deus. Durante a oitava do Natal celebra-se algumas festas importantes: Santo Estevão, primeiro mártir da Igreja; São João Evangelista, o discípulo amado; os Santos Inocentes, mortos por Heródes e a Sagrada Família de Nazaré. Estas festas querem exprimir o aspecto do testemunho do mistério da encarnação do Senhor.

6. O Ciclo da Páscoa

Já sabemos como se organizou o ciclo pascal. O que queremos ver aqui é um pouco o seu aspecto celebrativo.
Este tempo é o mais importante do ano litúrgico. Ele inicia-se na Quarta Feira de Cinzas e termina com a solenidade de Pentecostes.
O ponto máximo do ciclo pascal é a grande Vigília Pascal. Todo o restante estão em função desta vigília.
“A celebração da Páscoa requer um período de preparação que varia conforme as épocas, e um período de complementação que se encerra no dia de Pentecostes. Por volta do século II, quando é celebrada a Páscoa semanal, tende-se a fixar um domingo que represente o aniversário da paixão e ressurreição de Cristo. Este domingo será preparado primeiramente por três dias santos, depois por uma semana, a seguir por três, e finalmente por cinco e por sete semanas. Ao mesmo tempo, este dia da Páscoa será prolongado por cinqüenta dias, celebrados como um só dia e terá seu coroamento na celebração da festa de Pentecostes.”

Preparação: Quaresma (5 domingos) / Tríduo Pascal /
Celebração: Vigília Pascal
Prolongamento: Domingos da Páscoa (6 domingos) / Ascensão / Pentecostes

6.1 Quaresma

O tempo da Quaresma tem por finalidade preparar à Páscoa. Este período de preparação à festa da Páscoa tem início na Quarta Feira de Cinzas, onde se impõe as cinzas. “A imposição das cinzas foi o sinal concreto do rito de entrada em penitencia.” A Quaresma constitui-se de 40 dias de intensa preparação para a grande Vigília Pascal. Nestes quarenta dias somos convocados a intensificarmos nossas orações, a fazermos penitencia e praticarmos obras de caridade
No Brasil, durante a quaresma, a Igreja realiza a Campanha da Fraternidade. Ela pretende ser uma ajuda para vivermos mais intensamente a quaresma. Porém, deve-se tomar muito cuidado para que o tema da Campanha não deixe em segundo plano toda a espiritualidade que a quaresma contém. Aliás, espiritualidade esta que deve ser resgatada por nossas comunidades que as vezes se perdem envolvidas por demais com o tema da campanha, esquecendo-se que a campanha da fraternidade está em função da quaresma e não a quaresma em função da campanha.
O ponto mais alto deste período é a Semana Santa. A quaresma termina na Quinta Feira Santa, antes da celebração da Ceia. No domingo anterior a quinta feira, celebra-se a procissão de Ramos. Este teve origem em Jerusalém. Os cristãos se reuniam fora da cidade e após ouvirem o evangelho seguiam em direção a porta da cidade com ramos e cantando hosanas. Em Roma, celebrava-se neste dia a Paixão. Porém mais tarde, também em Roma foi introduzida esta procissão, assim como em toda a Igreja Ocidental. Porém, conservaram as duas celebrações. Apenas juntaram uma com a outra. Por este motivo é que no domingo de Ramos, ouvimos o evangelho da entrada de Jesus em Jerusalém e depois o evangelho da paixão.

6.2 Tríduo Pascal

O Tríduo Pascal é o centro do Ano Litúrgico. Ele é a síntese da celebração do mistério da Paixão-Morte e Ressurreição do Senhor no Ano Litúrgico. Como nos alerta Alberto Beckhäuser, o tríduo pascal deve ser visto não somente como uma preparação à grande Vigília Pascal, mas sim, como um todo. Cada celebração depende da outra para se completar.

6.2.1 Quinta Feira Santa

A celebração da Quinta Feira Santa possui dois momentos: o primeiro, pela manhã celebra a missa dos óleos, ou a missa do Crisma. Esta missa possui dois aspectos: a consagração dos óleos santos que serão utilizados nos sacramentos do batismo, crisma, ordem e na unção dos enfermos e também possui o aspecto sacerdotal. É oportunidade que o bispo tem de reunir em torno de si todo o seu clero. Este segundo aspecto quer ressaltar não somente o sacerdócio do clero, mas também o sacerdócio comum a todos os cristãos.
Em algumas dioceses, esta missa é celebrada na noite de quarta feira. Esta mudança tem-se mostrado bem sucedida devido a impossibilidade dos fiéis de participarem das duas missas na quinta feira.
O segundo momento da Quinta Feira Santa é a celebração da Ceia do Senhor. Nesta missa dá-se um especial realce ao Mistério da Eucaristia. Esta missa acentua a entrega de Cristo por nós na Eucaristia e a traição de Judas. Esta celebração também realça o serviço fraterno e para acentuar o laço estabelecido pelo próprio Cristo entre a Eucaristia e o serviço fraterno, celebra-se após a Liturgia da Palavra o Lava-pés. Nesta missa também se faz a transladação do Santíssimo Sacramento que é exposto em um lugar reservado para adoração dos fiéis. Após a transladação, é de costume tirar as toalhas do altar simbolizando o desnudamento de Jesus Cristo.

6.2.2 Sexta Feira Santa

A celebração da Sexta Feira Santa tem sua origem em Jerusalém, no final do século IV. “Segundo o relato vivo que nos deixou Etéria, trata-se de um dia consagrado integralmente a uma oração itinerante que leva os fiéis, na Quinta Feira Santa, do Monte das Oliveiras até Getsêmani, depois, na Sexta Feira Santa, do Cenáculo ( onde se venerava a coluna da flagelação ) até o Gólgota. Neste local o bispo apresenta o lenho da cruz à veneração do povo. Cada estação comporta leitura das profecias da Paixão bem como dos evangelhos, canto dos salmos e orações.”
A liturgia da Sexta Feira Santa celebra o Mistério da Morte de Cristo. Esta liturgia desdobra-se em três partes: “Proclamação da Palavra, centrada na leitura da Paixão, com preces universais; adoração da cruz e comunhão.”
A Sexta Feira Santa exprime uma teologia da cruz que segundo São João, não é apenas um instrumento de morte, mas também de exaltação. Por isso na sexta feira a cruz é venerada como sinal de vitória, instrumento de salvação.
Este dia não é de luto, mas dia em que contemplamos o sacrifício do Senhor, fonte de nossa salvação. Neste dia a Igreja recomenda aos fiéis que seja observado o jejum. O jejum é um sinal de nossa participação no sacrifício de Cristo.

6.2.3 Sábado Santo

O Sábado Santo é um dia alitúrgico, ou seja, neste dia a Igreja não celebra a Eucaristia. É um dia voltado para o recolhimento, silêncio, oração e jejum.
O Sábado Santo nos quer fazer viver a “descida” do Cristo a mansão dos mortos. Descida esta, que redimiu àqueles que, já mortos, esperavam a redenção.
Neste dia a Igreja somente se reúne para celebrar a Liturgia das Horas. Com esta oração, celebramos o repouso de Cristo no sepulcro. O Sábado Santo termina com a Grande Vigília Pascal, celebrada a noite.

6.2.4 Vigília Pascal

A Vigília Pascal é o centro e o núcleo de todo Mistério Pascal de Cristo. Ela é também o centro do Ano Litúrgico. “Poucas celebrações litúrgicas são tão ricas de conteúdos e de simbolismo como a Vigília Pascal. O coração de todo o ano litúrgico, do qual se irradia todas as outras celebrações, é esta Vigília que culmina com a oferta do sacrifício pascal de Cristo. Nesta noite santa, a Igreja celebra, de modo sacramental mais plena, a obra da redenção e da perfeita glorificação de Deus, como memória, presença e expectativa.” Esta Vigília é caracterizada por um forte simbolismo: fogo, água, luz, óleo, pão e vinho.
A celebração inicia-se com o rito do fogo e o do círio. A assembléia reúne-se fora da igreja e junto ao fogo aceso o sacerdote acende o círio que simboliza Jesus Ressuscitado que vence as trevas do mal. Depois segue-se em procissão rumo ao interior da igreja, onde, todos tendo acendido suas velas no círio, cantam o “Exulte”. Este hino canta as maravilhas da história da salvação e agradece a Jesus Cristo ressuscitado por sua Luz que nos trouxe vida nova. Ao término deste hino, inicia-se a Liturgia da Palavra que é composta de nove leituras: sete do Antigo Testamento e duas do Novo Testamento. Após cada leitura do AT faz-se um Salmo responsorial e uma oração feita pelo presidente da celebração.
Depois da Liturgia da Palavra, passa-se à Liturgia Batismal. “Nesta noite a Igreja, a comunidade, dá à luz novos filhos pelo batismo. Todos renovam o seu batismo, para reassumirem sua missão de mãe, de acolher a vida e colocar-se a serviço dela.”
Terminada a Liturgia Batismal, começa então a Liturgia Eucarística que segue normalmente.
Como podemos perceber. Esta Vigília é composta de quatro partes: celebração da Luz, celebração da Palavra, celebração do batismo e celebração da Eucaristia. “O fato de vigiar toda a noite ou uma parte dela significa que: na noite desta vida, esperamos a aurora da ressurreição (a volta do Cristo) que, misteriosamente, já nos ilumina (celebração da luz). A celebração da Palavra deve lembrar, em princípio, a totalidade da história da salvação. Na celebração batismal, revivemos a realidade misteriosa de nossa morte e de nossa ressurreição em Cristo. Tudo culmina na eucaristia, que é ainda participação na morte e ressurreição de Cristo, mas que o é mais intensamente nesta noite, por ter sido preparada de um modo especial pelo conjunto da comunidade.”
Devido a uma certa privação dos fiéis de participaram desta Vigília, ocorrida a tempos atrás por ter sido reservada apenas ao clero, teve como conseqüência um afastamento dos fiéis desta celebração e criação e valorização de devoções populares que vieram para suprir esta privação. Assim os fiéis começaram a valorizarem a via-sacra, as procissões, etc. Deve-se no entanto, resgatar o valor perdido da celebração da Vigília Pascal no meio popular. É preciso conscientizar os cristãos que esta Vigília é a celebração mais importante da Igreja.

6.3 O Prolongamento da Páscoa até Pentecostes

Assim como a festa da Vigília Pascal acrescentaram um período de preparação (quaresma), também introduziram um prolongamento que dura 50 dias após o domingo de Páscoa. Este prolongamento compreende-se de: “oitava de Páscoa, outros domingos pascais como a festa da Ascensão e Pentecostes como ponto altos, sendo Pentecostes seu ponto final.”
A Oitava Pascal: “Os primeiros oito dias do Tempo Pascal constituem a Oitava da Páscoa e são celebrados como solenidade do Senhor. A oitava da Páscoa tem precedência sobre qualquer outra celebração.”
Ascensão: No quadragésimo dia do Tempo Pascal, celebra-se a Ascensão do Senhor. Porém, no Brasil por não ser feriado neste dia, a solenidade é celebrada no 7º domingo da Páscoa. Para nós o que importa é o mistério celebrado. “Esse mistério faz parte integrante da Páscoa. O Jesus que nos salva plenamente, segundo o plano de Deus, não é o Jesus do Natal e da cruz, mas o Jesus ressuscitado e glorificado, constituído pelo Pai Messias e Senhor no pleno exercício do seu sacerdócio, novo Adão feito Espírito vivificante ( cf. 1Cor 15,45 ). O mistério da Ascensão constitui a inauguração da realeza universal e cósmica do Senhor e do seu poder no mundo ( cf. Ef 1,22-23 ).
Pentecostes: a solenidade de Pentecostes é a última comemoração do Tempo Pascal. É o término do prolongamento pascal. Esta solenidade celebra-se no quinqüasésimo dia da Páscoa e leva a cumprimento pleno o mistério pascal. “Liturgicamente se celebra a festa de Pentecostes como a irradiação do Espírito e o surgimento da Igreja.” “Em cada solenidade de Pentecostes, a Igreja reaviva o Espírito que nos foi dado como Dom de Deus. Assim, reanimados e fortalecidos, seremos fecundos na gestação do Reino de Deus, levando à plenitude a vida nova recebida pela fé e pelo batismo.” “Todo este tempo era e deve ser vivido em clima de festa. Festa não porque se trabalha, mas porque o mistério celebrado causa impressão muito mais forte em nós. Esse mistério é sempre o mesmo. Cristo ressuscitado ( Páscoa ), glorificado pelo Pai ( Ascensão ) nos envia o Espírito Paráclito ( Pentecostes ) como havia prometido.”

7. Tempo Comum

Além do Ciclo Pascal e do Ciclo do Natal, existe um tempo constituído de 34 semanas e que não celebra um aspecto particular do mistério de Cristo. As Normas Universais sobre o Ano Litúrgico nos diz o seguinte: “Além dos Tempos que têm características própria, restam no ciclo anual 33 ou 34 semanas nas quais não se celebra nenhum aspecto especial do mistério de Cristo em sua plenitude, principalmente aos domingos. Este período é chamado de Tempo Comum.”
O Tempo Comum se situa entre a festa da Epifania e vai até a terça feira anterior a cinzas e da segunda feira após Pentecostes até as vésperas do primeiro domingo do advento. O número de semanas entre a Epifania e a Quaresma variam de acordo com a data da Páscoa.
Tempo Comum não significa ser um tempo sem significado dentro do Ano Litúrgico. “O comum distingue-se do extraordinário, do festivo. No Ano Litúrgico, como em nossa vida, existem tempos fortes de festa e tempos ordinários, comuns.”
O Tempo Comum não celebra o mistério de Cristo no seu aspecto particular: encarnação, paixão, morte e ressurreição, etc., mas o celebra na sua totalidade.
Dentro do Tempo Comum também celebramos algumas festas do Senhor de caráter particular. Celebramos assim a Transfiguração, a Exaltação da Santa Cruz e particularmente na Igreja do Ocidente celebra-se também as festas da Santíssima Trindade, Sagrado Coração de Jesus e Cristo Rei do Universo.
Esta última festa marca o encerramento do Ano Litúrgico. Dai em diante inicia-se um novo Ano Litúrgico com o Advento.

8. Culto a Nossa Senhora no Ano Litúrgico

A Igreja, desde os primeiros séculos já comemorava Nossa Senhora no culto litúrgico. Maria “ocupa um lugar todo especial dentro da vida espiritual da Igreja e seu culto.” O culto a Nossa Senhora não é algo paralelo ao mistério de Cristo, mas está intimamente relacionado com ele e com sua Igreja. O documento sobre a Sagrada Liturgia nos diz o seguinte: “A Santa Igreja venera com especial amor a Bem-aventurada Mãe de Deus Maria, que por um vínculo indissolúvel está unida à obra salvífica de seu Filho.”
“Entre todos os santos que a Igreja celebra em seu culto litúrgico, o lugar privilegiado pertence ‘Àquela que ocupa na santa Igreja o lugar mais elevado depois do Cristo e que está muito próxima de nós’ (LG 54): a Virgem Maria.
Dada a união íntima entre Maria e seu Filho, não é de admirar que certas festas do Senhor sejam também festas da Virgem. Isso acontece em primeiro lugar com o Natal e a Anunciação. O nascimento virginal se acha no centro da existência de Maria; é a razão de ser dos outros privilégios seus: Maria é a Mãe de Deus. O que ela acolheu em sua carne, viveu-o em espírito, como disso dá testemunho sua resposta ao anjo, seu Magnificat e o fato de que ela conservou e meditou os acontecimentos da Natividade em seu coração. Conservando a fé, sem compreender sempre, esteve junto de seu Filho, de pé, ao lado da cruz. Assim realizou ela o ideal dos ‘pobres de Yahvé’, fiéis aos ensinamentos dos profetas, e se tornou o modelo dos cristãos. É verdade que, nem a Bíblia nem a tradição antiga formulam claramente que Maria tenha ultrapassado todos os outros nessa atividade e que ela seja perfeitamente santa sob todos os aspectos. Isto foi uma conclusão que a Igreja universal tirou, a partir do século V, do fato (dogmatizado em Éfeso) de ser ela, em toda a realidade, Mãe de Deus.
Na antigüidade, sentiu-se a necessidade de celebrar uma especial memória da Virgem, nas proximidades do Natal; em Roma, fixou-se o oitavo dia, 1º de janeiro, e é esse uso que acaba de ser restaurado. Comentando esta festa, ter-se-á o cuidado de apresentá-la como parte integrante da Natividade. Ela acentua o papel que tem a Virgem, no mistério da encarnação, no caso em que esse aspecto corresse o risco de não ser suficientemente percebido na própria festa do Natal.
A partir da maternidade divina, a Igreja conclui que Maria devia ser isenta de tudo que seja pecado, logo também do pecado original e das conseqüências do pecado e, portanto, igualmente da corrupção da carne. Daí confessamos e festejamos sua Imaculada Conceição e sua Assunção. A primeira desses festas celebra sua eleição toda especial desde o início de sua existência, eleição gratuita, modelo de nossa própria eleição ao batismo. A segunda celebra o acabamento do mistério pascal em Maria, sua entrada no estado definitivo da ressurreição; a Assunção lembra-nos que a redenção concerne a todo o homem, alma e corpo, e que ela só terá seu acabamento no dia em que, por nossa vez, ressuscitarmos. Assim como a ci nqüentena pascal e o advento essa festa nos orienta, pois, para a espera da parusia.”

9. A celebração dos santos no Ano Litúrgico

O culto dos mártires, teve seu início com o martírio de São Policarpo, no ano de 155. Este, em uma carta teria manifestado o desejo de que os cristãos se reunissem junto do seu sepulcro para comemorarem seu aniversário de martírio.
“O culto dos mártires foi o primeiro a surgir ao lado da celebração da Páscoa. O fato é mais do que significativo: este culto não é senão um aspecto do mistério pascal. Se os mártires, com seu sofrimento, testemunharam Cristo, com maior razão é Cristo que neles testemunhou o Pai.”
O culto dos mártires, inicialmente era estritamente local, porém, com o tempo foi se estendendo pelas Igrejas vizinhas até atingir toda a Igreja Universal.
Com o fim do período das perseguição à Igreja, os cristãos estenderam o conceito de mártir à todos aqueles que de certa forma deram testemunho de Cristo e sua doutrina. Este conceito estendeu-se aos “confessores da fé”, aos ascetas, as virgens, os monges, até estender-se “a todo o fiel que tenha dado testemunho heróico de vida cristã em qualquer situação.”
O centro da celebração do culto da Igreja é sempre o mistério pascal de Cristo. “O santo participa da plenitude do mistério pascal de Cristo, e a sua santidade existe em função desta participação.” “Nos santos a Igreja celebra, portanto, o mistério de Cristo, conhecido nos seus frutos e realizados nos seus membros mais semelhantes ao Cristo morto e ressuscitado.”

10. Conclusão

O Ano Litúrgico gira em torno do Mistério Pascal de Cristo. “O Ano Litúrgico, em seu valor essencial, é o ano de Cristo, ou melhor, é o próprio Cristo que vive na sua Igreja e intercede continuamente por nós junto ao Pai.” Este mistério deve ser vivido como uma realidade. O Ano Litúrgico atualiza de forma sacramental a obra salvífica de Cristo. O Ano Litúrgico deve ser momento privilegiado que nos leva a vivermos o mistério pascal de Cristo em sua plenitude O que se observa é que o Ano Litúrgico mais parece uma oportunidade de se pôr em prática certas iniciativas pastorais, deixando em segundo plano o aspecto celebrativo do mistério de Cristo. Devemos tem bem claro que o Ano Litúrgico não constitui o ponto de partida para uma ação evangelizadora, mas sim o ponto de chegada (cf. SC 10). “De fato, a liturgia é um ponto de chegada, porque é sempre o ato de fiéis que conscientemente sabem aquilo que celebram e alimentam a sua fé mediante a própria celebração (cf. SC 9, 14, 19, 48).
A evangelização deve preceder a liturgia. E o que tem causado tantos erros é a inexistência desta evangelização que possa levar os fiéis à uma participação consciente da celebração do mistério pascal de Cristo.

Pe. Cristiano Marmelo Pinto
Presbítero da Diocese de Santo André - SP, pároco na Paróquia Menino Jesus em São Bernardo do Campo - SP, Mestre em Teologia Sistemárica com Especialização em Liturgia pela PUC-SP, Especialista em Música Sacra pela Uni-FAI - São Paulo. Professor no Instituto de Teologia de Santo André.