sábado, 9 de março de 2019



HOMILIA DA QUARTA-FEIRA DE CINZAS
(Jl 2,12-18; Sl 50; 2Cor 5,20-6,2; Mt 6,1-6.16-18)

A quarta-feira de cinzas abre a quaresma. Quaresma, como já sabemos, é um período de quarenta dias em que nos preparamos para celebrar a Páscoa do Senhor. Tempo de penitência e conversão. É por isso que ao recebermos as cinzas ouvimos: “Convertei-vos e crede no evangelho” (Mc 1,15).

As cinzas nos indicam que o nosso corpo mortal veio do pó e para o pó voltará. No fundo é um apelo para que tomemos consciência de que nossa vida neste mundo é passageira. Somos transitórios neste mundo e por isso, devemos fazer valer a pena nossa vida nesta terra, não tendo atitudes mesquinhas, arrogantes, como se fôssemos eternos ou superiores aos outros. No fim, todos iremos para o mesmo lugar, ou seja, nosso corpo mortal, se tornará pó novamente. Todos iguais.

As cinzas em nossa cabeça, pretende nos fazer abrir o coração para a prática da misericórdia, fazendo caridade aos outros e nos tornando mais humildes. E principalmente, as cinzas devem ser sinal de nossa conversão, que deve ser verdadeira. Deus quer que voltemos para ele. É este o apelo que nos faz a primeira leitura ao dizer: “Voltai para mim com todo o vosso coração” (Jl 2,12). É o mesmo apelo que nos faz São Paulo na segunda leitura de hoje quando ele nos diz: “Deixai-vos reconciliar com Deus” (1Cor 5,20). Deus nos quer de volta, e para isso, como nos mostra o profeta Joel,  Deus é: “benigno e compassivo, paciente e cheio de misericórdia” (Jl 2,13).

A liturgia com a qual iniciamos a quaresma é um apelo para reconhecermos nossa pequenez, nossas misérias e fraquezas, e elevarmos a Deus nossa suplica, como faz o salmista: “Tende piedade, ó meu Deus, misericórdia!”

A quaresma é, portanto, um tempo de retorno, de corrigir nossa rota, nosso caminho. Voltar para o caminho de Deus e não se iludir com outros caminhos. De procurarmos ter atitudes condizentes com a nossa condição de filhos e filhas de Deus.

Este tempo nos mostra que nossas atitudes não devem ser feitas por pura aparência, na tentativa de mostrar para os outros e obtermos reconhecimentos. É por isso que Jesus no evangelho pede para que tudo o que fizermos não seja para nos aparecer, nos preocupando com que os outros possam ver, mas sim, nossa preocupação deve ser de que Deus veja a sinceridade de nosso coração. Por isso, Jesus manda que as práticas da esmola, da oração e do jejum sejam discretas. Basta que Deus saiba.

Estas três práticas que aparecem no evangelho, são chamadas de práticas quaresmais, ou exercícios quaresmais. Elas tem a finalidade de nos colocar em sintonia com o nosso próximo, com Deus e conosco mesmo. Elas devem ser algo que vem do fundo do coração e praticadas sem alarde, no silêncio, como Jesus recomenda no evangelho.

A palavra “esmola” vem do grego, e significa intervir em favor de quem está necessitado, porque nos sentimos envolvidos no seu sofrimento. é o mesmo que ter compaixão, em sentido moderno é ser solidário com o outro. Por isso, a quaresma é tempo de solidariedade.

Jesus critica aquele tipo de oração que podemos fazer em público, só para ser vistos, elogiados pelos outros. Recomenda que a oração seja reservada, particular, bastando que Deus saiba. Pela oração nos colocamos em sintonia com Deus. A oração é um momento de recolhimento, não é uma oração de aparência. A oração que chega a Deus é aquela feita com sinceridade de coração, a oração em que nos colocamos diante de Deus sem medo de mostrar nossas fraquezas, pecados, nossas falhas e erros, porque sabemos que Deus é bondoso e cheio de misericórdia.

A crítica que Jesus faz ao jejum é para que não seja um jejum hipócrita como muito cristãos ainda fazem. Jejum ou abstinência, sem a intenção de mudar a vida, de se transformar para melhor. O jejum que Jesus quer está alinhado com o que diz o profeta Isaías e que agrada a Deus: “É romper as cadeias injustas, desatar as cordas do jugo, mandar embora livres os oprimidos, quebrar toda espécie de jugo. É repartir seu alimento com o faminto, dar abrigo aos infelizes sem asilo, vestir os maltrapilhos, em lugar de desviar-se de seu semelhante” (Is 58,6-7). Jejum assim é o mesmo que caridade.

Nos privamos de certos alimentos (abstinência) ou de alguma refeição (jejum), para nos colocarmos no lugar daqueles que nada tem, que são privados de seu sustento. Nosso jejum deve ser solidário com os que sofrem. É este o jejum que Deus quer.

Por fim, hoje também iniciamos a CF 2019 que tem como tema: “Fraternidade e políticas públicas”. Ela pretende nos chamar a atenção para a necessidade de nos envolvermos com políticas públicas que favoreçam o povo em suas necessidades básicas, como educação, saúde, moradia, trabalho... Não podemos deixar exclusivamente nas mãos de nossos governantes, embora sejam eles os responsáveis por essas políticas, porque, como já sabemos,  eles estão sempre preocupados com seus interesses particulares e partidários, e nunca, com o bem comum do nosso povo. Isto só acabará quando tomarmos consciência de nossa participação, e exigir que cumpram seu papel de cuidar do nosso bem comum e não de seus interesses.

Paz no coração!
Pe. Cristiano Marmelo Pinto

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